segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Entrevista do meu padrinho para o Zero Hora - 11 de dezembro de 2010

O gaúcho que Projeta Abu Dhabi Estilo Oriente

Tarso Endres arquiteto nos Emirados Árabes Unidos

De Abu Dhabi


Ele saiu do Rio Grande do Sul e acabou no deserto, onde se consagrou como um artista das formas opulentas que marcam a paisagem dos Emirados Árabes Unidos. O arquiteto gaúcho Tarso Endres conta como pensa as construções que planeja no país do Mundial


A primeira coisa que se fala dos Emirados Árabes, especificamente de Abu Dhabi e Dubai, é sua potente arquitetura. As formas elegantes, arrojadas e sofisticadas têm o traço de um gaúcho. Ele sim é elegante, arrojado e sofisticado. Mas antes que se fale mais sobre Tarso Endres, 46 anos, é preciso relacioná-lo a outro adjetivo: discreto.


Foi no início da tarde de sexta-feira que ZH foi conhecê-lo para contar sua impressionante trajetória internacional. Diretor da divisão de arquitetura da empresa italiana AiEngineering, Tarso assina projetos milionários deste paraíso de aço e vidro em proporções faraônicas. O que inclui a reforma de um dos palácios do presidente dos Emirados Árabes, considerado o mais importante do mundo árabe. É dele também o projeto de uma futura torre à beira-mar, de formas retorcidas e com um detalhe bem ao gosto da clientela local: uma cobertura dourada sobre parte do prédio, como se ouro estivesse escorrendo do topo.


Tarso passa longe do tipo que enfileira vantagem. Na conversa, não poupa detalhes sobre a cultura dos países nos quais viveu e discorre solto sobre o que é visivelmente sua paixão, a arquitetura.


Quanto ao custo dos projetos a que está dedicado ou sua poderosa rede de amigos, que passa pela realeza da moda internacional, D&G e Riccardo Tisci, nisso, é lacônico, como bom criativo que é:


– Por favor, não me pergunte sobre custos. Sinceramente não tenho ideia de valores. Minha função é projetar e saber a hora de dar o ponto final ao projeto. Pois na arquitetura isso é impossível, é sempre uma tentação melhorar e afinar ainda mais.


Nascido em Santa Maria, o arquiteto morou em Porto Alegre e formou-se na Unisinos. Com o diploma na mão, há mais de 20 anos, ganhou o mundo. Foram mais de 10 anos na Espanha, dois na Itália, três em Andorra, um doutorado e, recentemente, três anos em Dubai. Tarso é fluente no italiano, espanhol, francês, inglês e catalão.


Seus projetos estão em pranchetas em Dubai, mas já são realidade em construções no Kuwait, por exemplo, onde estão concluindo uma residência de 3,6 mil metros quadrados, a casa de um dos 20 homens mais ricos do mundo. A seguir, acompanhe parte da conversa com um gaúcho que conquistou o mundo, mas guarda a simplicidade do garoto que foi do Sul e o despojamento fundamental de um artista que transforma sonhos em realidade.

“Tenho de saber tudo para fazer o projeto dos sonhos”

Zero Hora – Como você definiria o que você vive aqui, nos Emirados Árabes, em termos de arquitetura?


Tarso Endres – Uma loucura (risos).


ZH – Como assim? É uma loucura de proporções, de valores? É um sonho?


Endres – É um sonho. Explico por meio de um fato recente. Dubai construiu o maior edifício do mundo, que se chamava até pouco tempo antes da inauguração Burj Dubai. Por motivos econômicos, ou o que for, Abu Dhabi resolveu ajudar Dubai, que estava falida. O edifício passou a se chamar Burj Khalifa, que é o nome do presidente dos Emirados Árabes, que é de Abu Dhabi. Essa necessidade de ostentação, de dizer aquilo que era Burj Dubai agora é meu e não é Dubai é Abu Dhabi é o que faz a maneira de viver deles. Quando eles fizeram isso, a Arábia Saudita começou a construção de outro edifício, que é o dobro desse. Vai o outro e diz: “Como você fez maior, vou fazer maior ainda”. Não tem sentido. É contra a natureza, é um absurdo.


ZH – Num lugar de sonho, você tem que fazer projetos de sonho. Quais são suas referências e fontes de inspiração?


Endres – É o próprio cliente, ele nem se dá conta. Normalmente, quando saio da reunião com o cliente, já tenho na cabeça como o projeto deve ser. Aí é só o tempo de colocar isso no papel. Isso que estamos fazendo, batendo um papo, faço com o cliente. E aqui isso é um pouco difícil. Com o árabe, você deve tomar cuidado para não invadir a privacidade dele. Mas para um arquiteto, isso é fundamental. Eu tenho que saber, por exemplo, se ele dorme com a mulher ou não.


ZH – Puxa, com você pergunta isso na primeira reunião?


Endres – Com jeitinho. Tenho de saber tudo da vida deles para conseguir fazer o projeto dos sonhos.


ZH – Como é a sua qualidade de vida morando em Dubai?


Endres – Sempre procurei fazer o que gosto. Encontrei o mesmo tipo de vida que encontraria em outro lugar, com uma diferença: você tem uma série de privações no dia a dia que a religião dá. Mas em contrapartida, é um lugar seguro, tem sol o ano todo.


ZH – A crise econômica chegou aos Emirados Árabes. Você sente isso na sua área de trabalho?


Endres – A crise é evidente porque todos os projetos estão sendo paralisados, estão sendo reduzidos. É sabido que foi feita uma redução do gasto público no orçamento do próximo ano. Para a reforma que projetei de um palácio, que é considerado o mais importante do mundo árabe, foi feito um concurso em que várias empresas internacionais participaram. É o palácio em que o presidente recebe autoridades internacionais e que são feitas todas as recepções oficiais. Ficamos entre os três finalistas, com fortes possibilidades de sermos os escolhidos. E os prazos estão sendo adiados.


ZH – O estilo da arquitetura local é esse dos espigões de vidro?


Endres – Não. Eles criaram uma falsa arquitetura árabe, assumindo como próprias coisas que não são.


ZH – Isso que a gente vê hoje aqui sendo erguido por nomes como Norman Foster, Zaha Hadid, Jean Nouvel, no futuro, vamos olhar para estes prédios envidraçados e torcidos e dizer que é a arquitetura dos Emirados?


Endres – Não, eles vão continuar dizendo que é aquela que eles assumiram como própria por ser árabe. Eles têm coisas bonitas, meu trabalho foca isso, dar formas e proporções para resultar em algo mais elegante.


ZH – Existe uma arquitetura contemporânea brasileira? Pode se falar desta regionalização na arquitetura?


Endres – Não. Se a gente fala de Oscar Niemeyer, mesmo assim é uma arquitetura contemporânea, não é brasileira. Existe uma arquitetura com uma linha definida que pode ser a de um arquiteto em especial, mas depois tem 25 que vão atrás.

Muito legal!!!! Afilhado cheio de orgulho!